INOVAÇÕES DEMOCRÁTICAS COM MEDIAÇÃO TECNOLÓGICA CÍVICA DIGITAL NO CONTEXTO ESCOLAR

É possível transformar as políticas educacionais por meio do uso de ferramentas cívicas digitais de participação social

A pesquisa intitulada “INOVAÇÕES DEMOCRÁTICAS COM MEDIAÇÃO TECNOLÓGICA CÍVICA DIGITAL NO CONTEXTO ESCOLAR”, desenvolvida pelo Doutorando Manoel dos Santos no Programa de Pós-graduação em Mudança Social e Participação Política na Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo, sob a orientação da Professora Drª Gisele da Silva Craveiro, focaliza a participação política com o uso de mediação tecnológica cívica digital para o monitoramento cidadão e avaliação de serviços e políticas públicas no ambiente escolar.

Esse estudo analisa como os processos de participação política em experiências de monitoramento cidadão, facilitados pelas plataformas cívicas de mediação tecnológica, contribuem para a produção, análise e uso de dados e informações na avaliação e tomada de decisão para a implementação de políticas públicas no contexto escolar. O período de análise compreende os anos de 2016 a 2021, durante o qual os casos estudados foram executados.

A pesquisa baseia-se na análise de cinco iniciativas incentivadas por órgãos de accountability burocrática, que visam produzir, analisar e utilizar dados e informações para a tomada de decisão, com o propósito de promover melhorias na execução de políticas e serviços públicos. As experiências específicas analisadas são as seguintes: 

  1. a campanha de monitoramento da merenda denominada Projeto Égua da Merenda, João!, no âmbito do Programa Nacional da Merenda Escolar, implementado em escolas estaduais pela CGU-Regional Pará, em parceria com a Secretaria de Estado da Educação do Pará e envolvendo o Movimento Pacto Estudantil pela Educação Pará (MPEPEP) e a Organização Social Belém (OSB- Belém), em Santarém, no Pará, entre 2016 e 2018;
  2. o Projeto Monitorando a Merenda, uma iniciativa do Projeto Ouvidoria Ativa do Programa Nacional da Merenda Escolar, implementado em escolas estaduais pela CGU-Regional Pará, em parceria com a Faculdade de Ciências Contábeis da Universidade Federal do Pará (UFPA), a Organização Social Belém (OSB- Belém) e a Secretaria de Estado da Educação do Pará, em Belém, Pará, entre 2016 e 2017;
  3. o Projeto Monitorando a Merenda, no âmbito do Programa Nacional da Merenda Escolar, implementado em escolas do Distrito Federal pela Controladoria Geral do Distrito Federal, com a anuência da Secretaria de Estado do Distrito Federal e a participação das escolas, do Instituto Federal de Fiscalização e Controle e do Center for Civic Media, em Brasília, entre 2016 e 2019;
  4. o Projeto Monitorando a Merenda, no âmbito do Programa Nacional da Merenda Escolar, implementado em escolas estaduais, capitaneado pela CGU-Regional Bahia, em parceria com a Secretaria da Educação do Estado da Bahia, com a Ouvidoria Vai à Escola da SEC/Ba e o Observatório Social da Despesa Pública de Jequié, entre 2018 e 2019 em Salvador, Jequié e Lauro de Freitas.
  5. o Projeto Estudantes de Atitude, é uma iniciativa desenvolvida no contexto escolar pela Controladoria Geral do Estado de Goiás (CGE-GO), em parceria com a Secretaria de Estado da Educação – SEDUC. 

Nessa etnografia do ecossistema brasileiro de participação política e cidadã, mediada por tecnologia cívica digital para o monitoramento e avaliação de serviços e políticas públicas no contexto escolar, a pesquisa aborda questões e iniciativas do mundo real, concentrando-se na melhoria dos serviços e políticas públicas nas escolas por meio da participação cidadã e da tomada de decisão baseada em dados, combinando abordagens top-down e bottom-up em configurações de arranjos socioestatais e societais.

As iniciativas de monitoramento cidadão e avaliação de serviços e políticas públicas no contexto escolar analisadas utilizam plataformas digitais como o Monitorando a Cidade e o WhatsApp nos quatro primeiros casos. Além disso, na quinta iniciativa, são empregadas diversas outras plataformas digitais, como o SurveyMonkey, Google Forms, Telegram, Whatsapp, Facebook, Instagram, Youtube e Smartsheet. Essas ferramentas tecnológicas digitais possibilitam a participação política e o empoderamento dos cidadãos nas relações e interfaces socioestatais e societais, através da coleta de dados e informações com mediação tecnológica cívica digital, permitindo identificar, compreender, colaborar, cocriar, incidir e transformar suas realidades por meio da cogovernança construída no contexto das inovações democráticas com o uso de tecnologias cívicas digitais.

De acordo com Gray (2016), dados e informações digitais devem ser usados para atender aos interesses da sociedade e dos cidadãos, por meio da “reimaginação da política de dados”, visando promover o desenvolvimento humano, o empoderamento cívico, o avanço do progresso social e o fortalecimento da democracia.

A utilização de ferramentas cívicas digitais na coleta de dados e informações possibilita a realização de “um processo coletivo que visa discutir questões críticas, obter informações para melhor compreendê-las e dialogar com atores locais para desenvolver soluções” (MARTANO et al., 2017).

Os resultados preliminares da pesquisa revelam que cada interfacemento dos mecanismos de accountability burocrática apresenta diferentes tipos e conformações de modelos e arranjos institucionais de monitoramento cidadão para a avaliação de serviços e políticas públicas. Verifica-se que, apesar do uso comum da mediação tecnológica cívica digital, em todas as iniciativas, o contexto sociopolítico contribui para a configuração de vontades políticas e de arranjos institucionais, levando a diferentes resultados.

Observa-se que a tecnologia cívica digital é um fator relevante para o engajamento dos cidadãos que adotam esse tipo de ferramenta como responsáveis pela coleta de dados, podendo fazer diferença para esse grupo social e arranjo específico, permitindo uma mudança positiva no processo de formulação e implementação de políticas e serviços públicos.

Assim, a participação política mediada por tecnologia cívica digital, nesses casos específicos, por meio da produção colaborativa de dados e informações com agilidade e relevância, contribui para aumentar a responsividade dos governos. Observa-se que os cidadãos apresentam contribuições e demandam serviços e políticas públicas de qualidade ao poder público, ativando ou interagindo com agências de accountability socioestatal e societal, exercendo o controle social, a fiscalização e a supervisão externa, em conjunto com a participação de atores da sociedade civil. A sociedade civil também exerce o controle social, articulando mecanismos e agências com poder de fiscalização e aplicação de sanções, conferindo legitimidade à participação da sociedade, sendo um ator estratégico para contribuir com a educação para a cidadania.


Para saber mais acesse o artigo intitulado “Processos de participação cidadã mediados por tecnologias digitais: um estudo sobre monitoramento participativo e avaliação de políticas públicas no contexto escolar”, publicado no 44o Encontro Anual da ANPOCS, realizado entre os dias 1 e 11 de dezembro de 2020.

Manoel dos Santos é Doutorando em Mudança Social e Participação Política pela Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP e integrante do grupo de pesquisa Colaboratório de Desenvolvimento e Participação (CoLab-USP).

Gisele da Silva Craveiro é Doutora em Engenharia de Sistemas pela USP, Mestre pela Unicamp em Ciências da Computação. Orientadora e Professora da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP, credenciada no Programa de Pós-graduação em Mudança Social e Participação Política, Líder do grupo de pesquisa Colaboratório de Desenvolvimento e Participação (CoLab-USP).